Era uma vila, um lugarejo, e nela, uma mulher.
Chamavam-na de bruxa, de feiticeira, de santa.
Outros dizem que era fada, e realizava desejos.
Ela tinha cabelos longos, até a cintura – enroscados uns nos outros, como correntes que prendem névoas – a pele branca, quase translúcida, e iluminada.
Segundo a lenda, ela tinha o poder de atar o tempo.
E assim, o tempo atado, não mais corria.
Ela sonhava, cantava breve com voz suave.
Balançava o corpo no ar, como se ar ali não houvesse.
Brincando com o tempo, o fazia voltar e ir. Voltar e ir.
Voando imperceptivelmente e nua.
Então, cinzamente, os anos iam passando.
Arremessados pela pruma-fada, e por ela desconduzidos.
Por um caminho sem som. Denso como caramelo, e sensível - como a pele dela mesma era sensível.
Fazendo de conta que o sonho era um devaneio alugado.
Uma poesia amassada e jogada ao vento. As rosas já eram tão murchas e descoloradas, As matas já eram tão verdes e transbordantes.
Quando ela resolveu parar de atar o tempo:
Dormiu, sonhou, sorriu, e cantou suave, com voz doce!
Como ela mesma era doce.
Os meses, que passavam como asteróides congelados, feitos de gases e décadas de silêncio, voltaram a borbulhar, fulgentes e tangenciais.
E ela, que voava sobre o tempo, caiu sobre plumas.
Respirando a mocidade enevoada pelo seu tempo fulgáz.
Os pés alados, agora sonsos. As mãos ligeiras, agora inertes. Os cabelos longos, agora amordaçados.
A pele clara, quase translúcida, já queimava como papel sob o fogo.
E como fogo, queimavam as horas, as seivas, a terra, as sombras, e o tempo.
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