quinta-feira, 4 de outubro de 2007

Amar…


Amar… é uma ocasião sublime para o indivíduo amadurecer, tornar-se algo em si mesmo, tornar-se um mundo para si, por causa de um outro ser; é uma grande e ilimitada exigência que se lhe faz, uma escolha para longe.
Rainer Maria Rilke


"Já não me importo"


"Já não me importo"
Já não me importo até com o que amo ou creio amar. Sou um navio que chegou a um porto e cujo movimento é ali estar. Nada me resta do que quis ou achei. Cheguei da festa, como fui para lá ou ainda irei Indiferente a quem sou ou suponho que mal sou, fito a gente que me rodeia e sempre rodeou, com um olhar que, sem o poder ver,sei que é sem ar de olhar a valer. E só me não cansa o que a brisa me traz de súbita mudança no que nada me faz.
(Fernando Pessoa)


"Lucidez perigosa"


Estou sentindo uma clareza tão grande que me anula como pessoa atual e comum: é uma lucidez vazia, como explicar? assim como um cálculo matemático perfeito do qual, no entanto, não se precise. Estou por assim dizer vendo claramente o vazio. E nem entendo aquilo que entendo: pois estou infinitamente maior que eu mesma, e não me alcanço. Além do que: que faço dessa lucidez? Sei também que esta minha lucidez pode-se tornar o inferno humano - já me aconteceu antes. Pois sei que - em termos de nossa diária e permanente acomodação resignada à irrealidade - essa clareza de realidade é um risco. Apagai, pois, minha flama, Deus, porque ela não me serve para viver os dias. Ajudai-me a de novo consistir dos modos possíveis. Eu consisto, eu consisto, amém.
(Clarice Lispector)


''Tabacaria"



Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou? Ser o que penso? Mas penso tanta coisa! E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos! Gênio? Neste momento cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu, e a história não marcará, quem sabe? Nem um, nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras. Não, não creio em mim. Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas! Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo? Não, nem em mim(...)".
(Álvaro de Campos)